30.1.10

Em branco

Faz tempo que eu não escrevo. Nem aqui nem em nenhum caderno, nem de noite nem de dia, nem coisa prática nem coisa poética. Me faz falta, muita. Durante um tempo achei que era natural, afinal os trabalhos, as compras de supermercado, os livros pra ler, a correria, as máquinas, a tecnologia.

Não é que eu pego o caderno e não vem nada. É que eu não pego caderno nenhum. Nem carta de amor, nem lista de compras, nada. Poema então, passa longe.

Sou eu que preciso cuidar disso, mas me entendam: comecei a escrever isso no computador da ilha de edicao do meu pai, onde passei a tarde de sabado tentando terminar um trabalho, sem sucesso. Continuei na minha ilha, sabado a noite, onde a coisa ainda nao rolou mesmo eu insistindo ate 23h30... Entao agora, domingao de sol, ca estou de volta a ilha de edicao numero 1 (num mac sem acentos, notem a diferenca!), tentando pela 3a vez gravar um dvd de um curta metragem no qual o meu trabalho ja deveria ter terminado ha meses!

Ok, pode-se dizer que ha tempos atras eu gastaria as horas vagas entre exportar o arquivo e queimar o dvd escrevendo poemas. E verdade, e tambem nos sinais de transito e nos bloquinhos que andavam na bolsa e em guardanapos de bar e. Mas gente, gastar quase 20h pra fazer um trabalho mecanico que meu assistente faria em 2h - se nao tivesse me abandonado e ido ser feliz no frio de Londres - e de enlouquecer o cidadao. E foda, nao e mole nao. Nao rola nenhum pensamento criativo, nenhum lirismo, so desejo de praticidade.

Nao, eu nao vou desistir. A poesia ainda e o que me faz mais feliz. E ja que nesses tempos ela tem sido mais dita do que escrita, talvez seja mesmo a hora de eu parar de adiar a criacao do espetaculo que sonho fazer com os meus poemas pra estrear no palco da Casa Poema. Isso, Maria, anuncia pra ter cobranca. Boa.

(e torcam por mim porque o arquivo ainda ta na metade do export...)

29.1.10

Usando, abuse!

Campanha sensacional pelo uso da camisinha, aqui. Do governo francês, claro, que não tem medo de chocar e não é refém do politicamente correto. Adorei!

4.1.10

Poema pra vovó - ao vivo e a cores

A Lelê gravou, tá registrado pra todo o sempre aqui.

Não foi de primeira, que eu falei meio no susto e chorei baldes.

Nem de segunda, que a vovó ouviu mal com o meu chororô e o barulho em volta, e pediu repeteco.

Foi de terceira, ensaiadinho, com direito a "ação" no início e tchauzinho no final, mas amei ter esse registro das minhas palavras pra ela com ela ali pertinho, do lado, sorrindo...

Pra entender o poema - porque é lindo de morrer

O poema que eu fiz pra vovo bebe na fonte de uma das muitas historias que ela contava pra gente dormir nas noites do sitio e da fazenda. Eu amo todas, e uma vez gravei ela contando pra gente nao perder nenhum detalhe, mas cade que acho a fita? A Luiza, que usou parte do video como trabalho na faculdade, tambem nao sabe da copia dela. Mas a tia Helo, boa de memoria, lembrou de tudo e escreveu de um jeito delicioso! So fica faltando a voz da vovo fazendo a fanha e cantando...


MARIA BOBA, UMA PRINCESINHA QUE FICOU MUDA E UM COELHINHO BRANCO

Era um vez uma linda princesinha que morava num castelo muito distante com seus pais. A princesinha vivia muito feliz e toda dia brincava nos jardins do palácio com seus brinquedos preditos – um pente de ouro, um espelho e uma boneca.

Um dia, sem que percebesse, surgiu no jardim um coelho branco e roubou seus três brinquedos. A princesinha ficou tão triste, tão triste, que nunca mais falou nem uma palavra.

O rei e a rainha ficaram desesperados com o silencio da filha. Imediatamente, mandaram mensageiros anunciar que aquele que fizesse a princesinha falar novamente receberia como recompensa a metade do seu reino, que era muito grande e muito rico

Primeiro vieram os palhaços. Fizeram todas as graças mas nenhuma palhaçada interessava à princesinha que continuava quieta, com o olhar distante e triste. Depois vieram malabaristas, trapezistas, amestradores de animais com seus cães que se equilibravam em bolas, mas nada interessou à princesa. De todo canto, dos reinos mais distantes, vieram artistas de toda espécie e fizeram todo tipo de graça, contaram as melhores historias, as piadas mais divertidas... A princesinha continuava muda e infeliz.

Bem longe dali morava uma mulher conhecida como Maria Boba. Ela era muito feia, pobre e, para piorar, tinha uma voz fanhosa que assustava todo mundo. A noticia de que o rei e a rainha haviam prometido a metade do reino a quem fizesse a filha voltar a falar chegou até ela. Maria Boba, para chacota dos vizinhos, resolveu ir até o castelo para tentar ganhar o premio.

Maria Boba morava muito longe e, como era pobre, saiu bem cedinho para ir caminhando até o castelo. À noite, cansada, resolveu procurar um lugar para dormir um pouco e sentou na soleira de uma porta que avistou no caminho.

Quando estava quase pegando no sono, ouviu uma voz : Entra...

Maria Boba levou muito susto mas resolveu obedecer. Abriu a porta e viu uma escada enorme quando escutou outra voz: Sobe... (alguém dizia sube...) Ainda apavorada, mas com medo de não cumprir a ordem. subiu a escada até chegar a uma enorme sala onde havia apenas um armário e uma bacia com leite.Maria Boba achou aquilo muito estranho... De repente, ela escutou um pequeno barulho e, assustada, correu para se esconder atrás de uma cortina.

Um coelhinho branco apareceu na sala. Rapidamente, o coelhinho pulou na bacia de leite e se transformou... num lindo príncipe. Maria Boba, bem escondidinha, observava tudo.

O príncipe abriu o armário e tirou da primeira gaveta um pente de ouro. E cantou, com a voz mais marvilhosa que já se tinha ouvido: Pente, ó pente, responda... onde está a princesa bela, que eu te vejo mas não vejo ela?

Guardou o pente, abriu outra gaveta e tirou dela um espelho. Cantou: Espelho, ó espelho, responda... onde está a princesa bela, que eu te vejo mas não vejo ela?

Em seguida guardou o pente e tirou da terceira gaveta uma boneca enquanto cantava, com sua voz, maravilhosa e triste: Boneca, ó boneca, responda... onde está a princesa bela, que eu te vejo mas não vejo ela?

Depois, pôs de novo a boneca na gaveta, fechou o armário, entrou na bacia de leite e se transformou novamente no coelhinho que, num instante, desapareceu do lugar.

Maria Boba achou aquilo tudo muito estranho mas pensou: essa pode ser uma boa história pra contar pra princesinha...

Continuou sua caminhada para o palácio e de noitinha se apresentou aos guardas do portão real dizendo que tinha vindo para fazer a princesa falar. Os guardas riram dela, mandaram ela voltar pra casa, quiseram impedir sua entrada. O rei, que estava por perto, já desesperado porque ninguém, nem os maiores artistas de todo o reino e dos reinos mais distantes, tinham conseguido fazer a princesa falar, ordenou que os guardas deixassem a pobre mulher entrar.

Na presença da princesa, Maria Boba começou a contar sua história com sua voz fanhosa e seu jeito esquisito de falar.

Disse que tinha vindo de um lugar muito distante, caminhado muito e sentado na soleira de uma casa para descansar.

A princesa escutava tudo sem nenhum interesse, quieta e triste.

Continuou, dizendo que tinha ouvido uma voz – Entra! – que havia uma escada enorme e outra voz havia ordenado – Sobe!. Ela obedeceu até chegar a uma enorme sala onde havia uma bacia de leite e um armário.

A princesa parecia nem escutar, o rei e arainha desanimados já queriam mandar aquela mulher embora enquanto os guardas riam entre si.

Mas Maria Boba continuou: de repente, surgiu um coelhinho branco...

A princesa, como que acordando de um sonho disse: OH!

Foi um regozijo no palácio, todos excitados porque a princesinha, depois de muitos meses calada, tinha dito uma palavra..

... e pulou na bacia de leite e se transformou num lindo príncipe...

A princesa novamente se desinteressou da historia e voltou a ter o mesmo olhar perdido.

... Aí, o príncipe abriu o armário e tirou da gaveta um pente de ouro e cantou: Pente, ó pente, responda... onde está a princesa bela, que eu te vejo mas não vejo ela?...

A princesa disse: OH! OH!

...depois, tirou de outra gaveta, um espelho e cantou novamente: Espelho, ó espelho, responda... onde está a princesa bela, que eu te vejo mas não vejo ela?...

E a princesa disse OH! OH! OH! ...

... guardou o espelho, abriu uma terceira gaveta e pegou uma boneca...

A princesa disse OH! OH!OH! e começou a falar pedindo a Maria Boba que levasse ela até aquela casa, que queria ver esse coelhinho, que devia ser o mesmo que tinha roubado seus brinquedos...

No palácio, a alegria foi geral. O rei e a rainha choravam de felicidade, os sinos tocavam , todos riam e dançavam de felicidade. A princesinha tinha voltado a falar!

No dia seguinte, ela e Maria Boba saíram para ir àquela casa. A princesa foi disfarçada, não foi vestida como princesa mas coberta com uma enorme capa que escondia suas roupas reais.

Chegando na casa, as duas se sentaram na soleira da porta e ouviram a voz: Entra! Depois, Sobe! E subiram a escada enorme até a sala com a bacia de leite. Correram para se esconder atrás da cortina quando d e repente surgiu o coelhinho branco que repetiu as mesmas coisas que Maria Boba tinha visto: pulou na bacia de leite, se transformou num lindo Principe, abriu a primeira gaveta do armário, tirou um pente de ouro, cantou, abriu a segunda gaveta, pegou um espelho, cantou, abriu a terceira gaveta e com a boneca na mão, cantou....

O Principe era muito lindo, tinha uma voz maravilhosa mas cantava muito triste. Quando fechou o armário e se preparava para pular na bacia de leite, a princesa e Maria Boba saíram de trás da cortina e ... oh!... o príncipe levou um susto muito grande mas logo reconheceu o seu amor e se abraçou a ela, contando que naquele momento um feitiço antigo tinha se quebrado e ele podia voltar a ser o príncipe que sempre fora.

Os dois, apaixonados, marcaram logo o casamento. Maria Boba ganhou a metade do reino e é claro, foi madrinha daquela união.

Nunca, em reino algum, houve festa mais maravilhosa. As paredes do castelo foram transformadas em brigadeiros, as flores do jardim cobertas de jujubas, caiam pipocas do céu como se fosse neve, das torneiras saiam vinho e os rios viraram os mais deliciosos sucos.

Eu fui a essa festa e trouxe docinhos e balas pra todos.mas meu cavalo, que era branco, de crina enorme e muito arisco, tropeçou na ponte e tudo caiu no rio... Não sobrou nem um docinho pra ninguém.

Entrou pela boca do pato, saiu pela boca do pinto, quem quiser que conte cinco.

Agora é hora de dormir. Boa noite, durmam com os anjinhos sonhando com um lindo coelhinho branco que pode virar o mais maravilhoso dos príncipes...

3.1.10

pra vovó, nos seus 91 anos

Não a super-mãe, a super-avó
Uma mulher mineira, brasileira, imperfeita
Uma mulher inteira andando pela vida

Sob o salto dos sapatos, debaixo do tailler
O pé como um peito de pombo
revela a vocação pro vôo

Filhos e processos pelos braços
Cuidados, agregados, pitos, abraços
Os anos se empilham como livros na estante
Boas histórias, dias tristes
Causos, risos, perdas

"Espelho, meu espelho, responda
onde está a princesa bela
que eu te vejo
mas não vejo ela?"

Eu vejo, vó, sua forma de rainha
no corpo de mulher
E sinto seu amor
Poderoso colchão pros nossos tombos

Seu amor opera o milagre possível de nos amarmos todos
Seu amor é espelho e é resposta
É coelho mergulhando na bacia de leite todo santo dia
docinho que nunca cai no rio quando a carruagem balança

É mágica possível
Benção silenciosa
Mãos dadas
Doação