30.6.08

sim, eu ainda sou poeta

Quem cujo dedo busca o gatilho
E agradece a falta da arma

Quem cujo medo assobia na noite
E rabisca nas revistas

Quem se trai nos gestos e quebra cartões e canetas
Quem morde o de dentro das bochechas
Quem morre de câncer
Quem morre do coração

Quem não dorme na tv de madrugada
Quem finge calma e bebe água
Quem range os dentes
Quem parte o espelho
Quem compra roupas
Quem lava o chão

Ninguém encara, de fato e por inteiro,
A solidão

25.6.08

explicações, revelações, reflexões

Eu sumi de novo. Peço desculpas e explico: começou com o frisson pós "super sexta", narrado aí embaixo. Continuou com montagens, prazos apertados, obra no apartamento, e piorou ainda mais com um trabalho novo que pintou. Bom, essa foi a explicação, passemos à revelação.

O trabalho novo é justo escrever pra outro blog, o do Nome Próprio, filme novo do Murilo Salles que estréia dia 18 de julho. Eu vi o filme há quase um ano, a convite do Murilo, na ilha da produtora dele em Ipanema, e saí da sala estupefata. O filme nasceu do universo da Clarah Averbuck, que eu leio em blog e livro há anos, e tem como protagonista a Leandra Leal, com uma intensidade que eu não via há tempos numa atriz de qualquer nacionalidade.

Achei o filme denso, engraçado, corajoso, daqueles em que se torce pela protagonista pra em seguida desprezá-la, em que se tem vergonha por ela e se sorri com ela e emoções contraditórias desse tipo, raras e boas demais de sentir por conta de um filme. Pois agora, perto do lançamento, o Murilo me chama de novo, dessa vez pra escrever pro blog do filme, onde está se esquentando essa estréia, e mesmo enrolada com tudo o que foi narrado no primeiro parágrafo não dava pra recusar.

Aí chegamos ao capítulo reflexão. Porque o Murilo é denso e não quer que o blog seja um espaço pra simplesmente contar casos da filmagem e fazer promoções e divulgar sessões. Nome Próprio é um filme construído com cuidado (e ainda assim instintivo), pensado, um filme feito a partir de muitas reflexões. Nessa onda, começamos por lá a pensar na questão da literatura que tem como ponto de partida a vida do escritor, e sua oposição a uma literatura mais racional, afastada do cotidiano do autor. Pensando nisso, eu escrevi lá um texto cheio de dúvidas. E pensando ainda mais, acabei escrevendo um texto mais cheio de convicções, que posto agora aqui.

BOXE LITERÁRIO - parte 2

O que importa mais? A vida ou a arte? O frenesi de cada passo ou de cada frase? Talvez seja justamente o encadeamento dos dois: viver intensamente pra fazer da vida matéria-prima pra escrita, sugar dos dias o estilo e os temas, diluir a fronteira entre real e imaginado. A literatura beat americana foi fundo nessa linha, propondo uma escrita menos “literária” e mais aproximada da vida. Nada de passar anos debruçado sobre um manuscrito mudando uma frase aqui e outra ali: escrever no ritmo dos acontecimentos, na pulsação da vida.

“Nome Próprio”, novo filme de Murilo Salles que estréia 18 de julho, teve origem na obra da gaúcha Clarah Averbuck, blogueira e escritora, e é perpassado por essa questão. Camila, a protagonista, é escritora, tem um blog, e ao longo do filme descobre como escrever seu primeiro livro. Em determinado momento, ela diz que se vai fazer da vida matéria-prima da sua escrita, é preciso vivê-la intensamente. E não hesita um segundo em cumprir o projeto. Mas nem sempre essa aproximação é fácil. Jack Kerouac, um dos maiores ícones beat, levava uma vida mais tranqüila do que seus romances faziam prever, e acabou morrendo de alcoolismo aos 47 anos tentando corresponder à imagem selvagem de seus personagens em romances como “On the road”. Dele pode-se dizer que “viver com a intensidade da arte levou-o ao infarte” (Leminski).

Paulo Lemisnki é um dos representantes brasileiros dessa linhagem de escritores. Poeta, romancista, publicitário, faixa-preta de judô, músico e letrista, ele misturou de tudo na sua escrita, sendo autor de haicais minimalistas e longos textos, sempre tendo o cotidiano como mestre, e defendendo que a escrita é sempre menor do que a vida.

“Aqui jaz um grande poeta.
Nada deixou escrito.
Esse silêncio, acredito,
São suas obras completas.”
(Paulo Leminski)

Na contra-mão desse pensamento estão escritores como James Joyce, cuja literatura testa os limites da língua e propõe inovações na escrita, capazes de se debruçar sobre manuscritos por anos a fio, mudando palavras e burilando cada frase. Em sua literatura o frescor da vida é substituído pelo vigor da linguagem, e escrever passa a ser muito mais importante do que viver. A vida pessoal não interfere na obra, que se contém em si mesma. Será essa forma de literatura menos intensa, ou justamente mais profunda por evitar a contaminação pelo cotidiano?

O surgimento dos blogs trouxe um fato novo a essa discussão. Passou a ser possível publicar simultaneamente à escrita. Tec tec tec, o clique num botão e lá vão pro mundo as palavras recém escritas num apartamento em algum lugar do mundo. Essa rapidez engendra uma escrita muito ligada à vida, e aí surge a discussão: literatura de blog pode ser literatura? Clarah Averbuck, precursora dessa questão na internet brasileira e que já está no terceiro livro publicado em papel, defende que “não existe literatura de blog, escrever é escrever e pronto, é só um meio de publicação com uma data no final”. E os blogs servem também como plataforma de divulgação de trabalhos que não necessariamente estão sendo escritos ali, dia-a-dia, mas que foram burilados por tempos a fio e agora se apresentam ali como alternativa aos livros impressos, tão difíceis de conquistar pros jovens autores.


Talvez a grande questão seja a qualidade do que se escreve e não a interferência da vida no processo, ou a agilidade da publicação. O que acontece essa manhã pode estar na tela essa noite e nas livrarias em um ano, e o que se espera de cada etapa do processo é que seja intensa, nova e vigorosa, seja ela real ou imaginada.

8.6.08

super sexta




Taí o registro de uma das noites mais incríveis de todos os nossos tempos: Rodrigo cantando uma música dele com a Ana Carolina na estréia do show de lançamento do cd e dvd dela em São Paulo. Esse convite da Ana juntou quase tudo que poderia ser bom: cantar no show dela, com ela, uma música dele, e em São Paulo, que ele ama.

Foram dias de antecipação e preparativos, era preciso produzir um terno moderno, então ligamos pra Nina e pra Anne e lá fomos nós pro O Estúdio, que faz roupas sensacionais e emprestou pro Rodrigo um terno lindo. Aí foram horas de troca-troca de roupa, testando mil figurinos, e ensaiando a música no violão, e falando com o Jerry, produtor super profissa e gentilíssimo da Ana, sobre passagem, hotel, horários, etc. Eu não tive dúvida: comprei uma passagem e fui junto, que eu não ia perder essa noite por nada! Cesar, pai do Rodrigo, também se juntou à trupe.

Sexta de manhã fomos pro aeroporto, e a falta de teto fez todos os vôos atrasarem e acabamos encontrando a banda da Ana toda, além da Elisa Lucinda, que também ia pra Sampa apresentar o "Parem de falar mal da rotina". De repente me dei conta do círculo se fechando, que foi na casa da Elisa que conhecemos a Ana, que foi lá que eu peguei o telefone dela pra convidar pro Te vejo na Laura, onde ela leu um poema e um conto da Elisa, e agora a gente indo pro show da Ana e a Elisa ali no aeroporto, compartilhando daquela felicidade...



(a gente e a Ana no Te vejo em setembro de 2004)

A chegada em Sampa foi corrida: almoço rápido e Rodrigo já foi pro HSBC Brasil passar o som levando a roupa do show, e ficou lá direto até de noite. Eu matei horas até finalmente ir pra lá às 21h30 com o Cesar, passei no camarim pra entregar pro Rodrigo a rosa que ele ia dar pra Ana no palco, ele estava tranqüilo e eu fiquei também, e fui pra platéia esperar a hora.

O show começou e eu fui ficando cada vez mais nervosa, sem saber exatamente em que momento seria a entrada dele, e quando chegou a hora fui só felicidade, uma emoção explosiva, e só um pensamento: ele tá pronto. A demora toda pra lançar o disco,toda a paciência que foi preciso ter e ainda será, tudo fez sentido. Subir naquele palco, com a Ana Carolina e aquela banda, e não medrar e não se encolher, e cantar lindo e ainda brincar, só o tempo dá essa cancha...

O público foi super quente com a música, a Ana adorou a participação, e a noite acabou gloriosa! Agora é ver e rever o vídeo aí em cima, pra reativar a memória quente desses minutos...

ps: na mesma hora do show, em Miami, minha mãe exibia o "Meu nome não é Johnny", que acabou ganhando seis prêmios no Festival lá. Isso é que é sexta-feira, minha gente!