Era cedo. Muito cedo pro meu horário. E estava frio, e era na Barra, que sempre me parece longe, mesmo que agora que eu moro na Gávea nem seja mais. Era cedo e frio e longe, mas quando eu entre naquele auditório cheio de carinhas tão jovens, nada disso era mais problema. Porque naquela hora o problema passou a ser como seduzir aquela platéia, no meio do seu dia normal de aula, pra ficar a fim de me ouvir e se deixar gostar de poesia.
Rapidinho parou de ter problema e foi ficando só gostoso e bom. Meninos e meninas de 11, 12, 13 anos, me ouvindo falar poemas entre tapinhas nas cabeças dos colegas da fila da frente, olhos atentos entre cochichos, e um rumor semi-silencioso quando sem querer uma palavra "sexo" escorregou, como quem não quer nada, de um poema.
E eles me encheram de perguntas ótimas, e me fizeram pensar como e porque eu escrevo, e me ajudaram a refletir sobre a importância da poesia, o motivo dela, a inspiração e o trabalho. Depois da super apresentação no auditório eu ainda fui a três salas de aula de 8o ano (a antiga 7a série, se é que eu entendi bem), e falei mais uns poemas, e bati mais uns papos. Do meio de uma fila veio a pergunta mais inusitada: se eu faço mais alguma coisa além de ser poeta, e eu falei de como é difícil ganhar dinheiro com poesia, de como a Elisa é a única que eu conheço que domina essa arte, e de como pra mim funciona bem ter outro trabalho que eu também gosto e poder ser poeta sem pressão.
Pois não é que quando eu já tô indo embora vem a menina da pergunta, de papel na mão, e me pára, toda tímida, pra me dizer que quer ser poeta quando crescer, e que quer ler um poema dela pra mim, que não é o melhor, ela disse, mas é o que ela tem lá na escola. Sentamos num banco e Luiza leu seu "Névoa", uma poeta tão jovem mas já uma poeta, atenta às imagens, fazendo meta-poesia, começando ainda e já escrevendo sobre a sua escrita. Seu poema me lembrou um dos meus primeiros, e quando eu disse pra ela que também gosto de escrever sobre a escrita ela me disse "eu gosto mais ainda de escrever sobre PORQUE escrevo!". Quer dizer, a menina sabe tudo, e promete.
Então Luiza, pra você, aqui vai um poema exatamente sobre o PORQUE da minha escrita - ou alguns dos porquês... E me manda um seu pra eu postar aqui também, e a gente dialogar poeticamente!
Escrevo porque tô viva
escrevo preciso
pra acordar, pra estar despida
porque o mundo não é só isso
que acontece aqui em cima
Escrevo porque não vivo
escrevo porque preciso dessa droga
esse colírio
escrevo pra pôr delírio
em tudo que é preto-e-branco
Escrevo pra estar viva
Escrevo porque aqui minto
as belezas que não tenho
e as coragens que persigo
escrevo porque assim finjo
Escrevo contra as burrices
contra os medos que hoje sinto
escrevo a favor do sonho
escrevo pra estar livre
Escrevo quando consigo
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