9.10.11

Ornitorrinco #15


OLHA-LÁ


MUZGA


Em casa quase nunca. Quando, quase sempre cd, as caixinhas de plástico com os dentes do miolo já um pouco quebrados, o círculo reluzente impresso em cores e o som ex-moderno comprado pelo pai no freeshop cujo controle remoto minúsculo e lindo nunca funcionou. Às vezes laptop: músicas desconhecidas saídas do HD externo recheado pelo amigo querido que ouve de tudo, a rádio online que toca a música do seu estado de espírito, o som dos amigos no myspace.

No carro sempre. Rádio. Com jabá ou sem jabá, o espaço pro acaso. Músicas antigas que lembram épocas, vozes novas, aquela pra cantar junto, aquela pra chorar no trânsito, aquela péssima que faz trocar correndo de estação.

Nem sempre o que impulsiona o dedo no dial é isso, claro. Às vezes, quase sempre, muito, rola o proibidão, aquelas que dizem o que a gente não pode ouvir naquela hora, que jogam o pensamento prum lugar onde não se pode ir ali, assim, no susto, e a fuga estratégica pro mais longe possível daquele som é necessária e honrosa. De vez em quando o sentimento é pego pelo pé e quando se vê as lágrimas já estão na pose, prontas pro mergulho de cabeça, mãos esticadas na frente do rosto na beirinha da piscina dos olhos e aí é se entregar. Chorar no carro é bom, sabe? A individualidade máxima, você e sua máquina de ferro, entre gentes em máquinas de ferro, sua emoção preservada sem o silêncio da casa vazia.

Mas música é mais alegria, e ultimamente ela tem nome: Faceiro&Fascinante - coletâneas de axé-maravilha organizadas pela poeta parceira de zine. E tome dançar "Afreketê" na sala ensolarada de manhã antes do trabalho, e tome rebolar com Chico César "Quando saio na rua com meu filá escuto logo: Jimmy Cliff", segurar os quadris ao som do fone de ouvido que diz "prefiro uma cerveja a ti" e um sotaque pernambucano que fala "Betinha" com aquele T que é pura delícia. 

Muzga suave, pra doer joelho ou cotovelo, pra ficar rouca, pra perder a linha, entorpecente, emocionante, vibrante, pra dar vexame na rua, pra andar, pra dormir, pra acordar, pra fazer sexo, pra fazer sucesso, pra ninar.


|Maria Rezende

(o tema era música - precisa dizer? 
pra ler os coleguinhas 
e seus textos deliciosos: 
www.nomedacousa.com
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e assina o bichinho!)

4 comentários:

malu.machadojf@gmail.com disse...

Olá Maria, vim aqui pelo blog da Anna Amorim e, se me permite, vou voltar mais vezes. Adorei seus textos. Muito, muito bons.

Parabéns pelo talento!

Adriana Riess Karnal disse...

"muzga"= uma canção de porre?
ah, guria, que texto bom de se ler...

Anônimo disse...

Ah amiga Maria... é bem isso mesmo.
E eu ando aprontando as minhas!! Aí li teu post e deu vontade de te mostrar!!! Beijoca do sul!!
http://soundcloud.com/ebehenck/das-asas

maria rezende disse...

everton, que legal sua visita, andei te lendo esses dias, sabia? tão bonito o livro, nossa, realmente adoro a sua poesia! e a música é linda também, vou ouvir mais!
adriana, musga é a música na intimidade... ;)
malu, venha sim, te espero!!
beijos, maria